A meteorologia avança no sentido de prevê cada vez mais com precisão e antecedência os fenômenos meteorológicos como seca, geadas, vendavais e outros. Saiba como são feitas as previsões atualmente e como as mudanças climáticas podem afetar o segmento agropecuário no futuro

Observar o formato das nuvens ou o deslocamento dos ventos, o comportamento das aves e das formigas. Durante gerações esses foram alguns dos métodos utilizados pelos produtores rurais em busca de decifrar os sinais da natureza e saber com antecedência como se comportariam o tempo e a temperatura no decorrer do ano.

Até que surgiram os especialistas em meteorologia com a promessa de fazer todas as previsões de fenômenos atmosféricos utilizando dados científicos e, assim, obter maior índice de acerto. Apesar de nem tudo ter ocorrido conforme o previsto, a metodologia avançou ao ponto de se tornar curso de universidade e criar mercado para milhares de profissionais pelo mundo.

Com o passar dos anos novas técnicas e tecnologias agregaram conhecimentos e facilidades para aumentar o índice de segurança das informações. Atualmente as previsões climáticas mais confiáveis são aquelas divulgadas com “até um ano de antecedência”, diz Clara Iwabe, doutora em meteorologia e professora da Universidade Estadual Paulista (UNESP).

Mas, atenção: existem diversos tipos de previsão e de prazos. “A previsão de tempo se refere ao estado momentâneo da atmosfera em certo local. A previsão de clima se refere ao estado médio da atmosfera em algum local”, esclarece Clara Iwabe. Em ambos o prazo “seguro” é de 15 dias.

Clara Iwabe,
doutora em meteorologia e professora da Universidade Estadual Paulista (UNESP)

“Geralmente, os centros de previsão assumem que para até três dias, a previsão do tempo é altamente confiável, para quatro a sete dias é aceitável. Essa confiabilidade depende do local e da época do ano. Por exemplo, observa-se que no outono e a primavera (estações de transição) os erros são maiores, mesmo em previsões para um dia em alguns casos. No verão e inverno a previsibilidade é melhor”, complementa a professora.

Falando sobre fenômenos que mais afetam as atividades agropecuárias – seca, chuva fora de época, geada, granizo… – Clara Iwabe informa que as previsões que podem ser feitas com maior antecedência são aquelas que dependem de fatores climáticos, como secas intensas ou períodos de chuva muito volumosa em determinada região do planeta.

“Por exemplo, se o ano é de El Niño, sabemos que a região Sul do Brasil terá chuvas acima do normal, e isto podemos prever com muita antecedência. Mas, se o ano é neutro, teremos que olhar para fenômenos de escala espacial e temporal menores, o que dificulta a previsibilidade para prazos maiores”, diz a professora.

Tempestade, geada e granizo são considerados fenômenos de tempo, ou seja, escala de espaço e tempo menores, então a previsibilidade vai ter a antecedência e a confiabilidade de uma previsão de tempo (três dias, ou de quatro a sete dias).

“Geada pode ser prevista com mais antecedência do que uma chuva de granizo, pois a geada ocorre com a entrada de uma massa de ar muito fria, já o granizo ocorre quando há formação de tempestades muito intensas e é um fenômeno local, o que dificulta ainda mais a previsão destes fenômenos através de modelos meteorológicos. No caso de previsão de tempestades e granizo, os radares meteorológicos são instrumentos essenciais e conseguem fazer o que chamamos de previsão a curtíssimo prazo (até três horas antes)”, diz Clara Iwabe.

É possível fazer uma previsão de chuva “confiável” para um período de até sete dias. Para fenômenos como geada, o prazo adequado é mais curto; e a onda de frio associada pode ser prevista com sete dias ou mais, dependendo muito de como está o comportamento de determinado modelo e da destreza do meteorologista.

“As chuvas torrenciais podem ser previstas num intervalo de curto prazo, digamos 48 horas de antecedência. Mas, mas às vezes, somente uma previsão de curtíssimo prazo, de algumas horas, torna-se mais precisa, com utilização do radar meteorológico. O granizo pode ser previsto também para 48 horas antes, porém, para obtenção de maior eficiência é necessário utilizar as imagens captadas nos radares meteorológicos, que pode chegar a poucas horas”, reforça Luiz Kondraski.

Luiz Kondraski,
meteorologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)

Erros de previsão | Por que muitas previsões ainda falham? Segundo a professora Clara Iwabe isso ocorre porque nem sempre é possível incluir a grande quantidade de dados necessários para a realização de uma previsão segura.

Mesmo com a utilização de supercomputadores, a velocidade de processamento de todos os dados inviabilizaria informar a previsão antes do seu acontecimento.

Dessa forma, “para que a informação do estado atmosférico futuro possa ser dada antecipadamente com os recursos tecnológicos que temos é necessário fazer algumas simplificações nas equações e diminuir o volume de informações que são inseridos nos computadores. Assim, a previsão do tempo ou do clima pode não se confirmar em algumas vezes quando fatores que desprezamos nas simplificações se tornarem importantes”.

Mudanças no clima? | Falando a respeito de mudanças climáticas – um dos temas preocupantes da atualidade – a professora diz que o clima da terra sofre variações na temperatura da atmosfera.

Mas, essa alteração não é inédita, pois a terra sofreu várias mudanças climáticas nos últimos 800 mil anos. “O problema é que nos últimos 150 anos, a velocidade de aumento da temperatura está muito maior que as variações que aconteceram no passado”.

Esse fenômeno (velocidade) está ligado à concentração dos gases que compõe a atmosfera terrestre, dentre outros fatores. “Desde a revolução industrial, tem se observado um aumento na concentração de alguns gases na atmosfera, como dióxido de carbono (CO2) e metano (CH4). Estes são chamados gases de efeito estufa porque têm a capacidade de reter o calor na atmosfera e são lançados por queima de combustíveis fósseis e desmatamento. Com maior quantidade destes gases, a retenção de calor também aumenta. A consequência é maior taxa de evaporação, causando déficit de água e secas em algumas regiões”, explica a Clara Iwabe.

Quando estes gases aumentam a uma taxa muito alta, o sistema terrestre não consegue absorver o excedente, expandindo a sua concentração na atmosfera e consequentemente elevando a temperatura da atmosfera.

Segundo a doutora, a grande discussão entre os cientistas “é se este aquecimento é uma variação natural, como houve no passado, ou se são consequências das atividades humanas. Os cientistas responsáveis pelos relatórios das pesquisas sobre o assunto mudanças climáticas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) dizem que as consequências do estado atual da atmosfera são irreversíveis, mas que é possível minimizar com medidas voltadas para não emissão e captura de CO2 da atmosfera”.

Nos estudos dos cientistas, a projeção de cenários negativos indica que haverá aumento da temperatura média global de até 4 ºC. Segundo Clara Iwabe, em atmosfera mais quente temos mais energia estocada e isto significa que podem ocorrer mais chuvas intensas, secas prolongadas e fenômenos meteorológicos como ciclones extratropicais e tropicais, além do aumento da temperatura do mar devido a maior disponibilidade energia na atmosfera, que é transferida para o oceano.

No campo | Desmatamento e a queimada provocam dois impactos no meio ambiente. Ao perder as árvores o meio ambiente fica sem parte de um “absorvedor de CO2 da atmosfera”. E a queima aumenta a emissão do mesmo gás.

“A mudança no uso do solo é inevitável na agricultura, sendo assim a agricultura é promovedoras de gases do efeito estufa na mudança do clima”, explica Clara Iwabe.

No que se refere à pecuária, a principal emissão é proveniente de arrotos e flatulências dos rebanhos bovinos. Eles expelem gás metano que “ataca” a camada de ozônio que protege a terra de maior incidência de raios solares.

Caso o cenário pessimista torne-se realidade, a agricultura sofrerá mais impactos negativos. “Sabemos que o desenvolvimento das plantas está diretamente relacionado com o tempo e o clima (dependente de temperatura, chuva, umidade, radiação solar). As culturas que eram propícias para uma região podem passar a não ser mais e as pragas e doenças podem aumentar em um ambiente com maior temperatura. Na pecuária, a produção de carne e leite pode diminuir devido ao estresse que os animais serão expostos em ambientes mais quentes. Tudo isso pode elevar os gastos da produção agropecuária”, enfatiza a professora.

Mas, como são atividades fundamentais para a humanidade, a professora recomenda a diminuição de impactos por meio da adoção de política voltada para redução dos fatores que agravam as mudanças no clima. “Desde a conscientização, passando pelo monitoramento, planejamento e ações como reflorestamento, sequestro de CO2, além de reserva financeira destinada às crises climáticas. Somente desta forma podemos reduzir os impactos em virtude das alterações climáticas no nosso planeta”.

Faltam equipamentos | Um dos fatores que impedem uma previsão com maior índice de acertos é a falta de equipamentos de captação de dados meteorológicos. “Em algumas regiões do Brasil podemos considerar aceitáveis os equipamentos instalados. No entanto, muitas áreas do território, principalmente na faixa norte do País, ainda não possuem coleta dos dados gerados pelos instrumentos”.  A informação é de Luiz Kondraski, meteorologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Ele acrescenta que a malha precisa ser mais compacta, pois quanto mais informações registradas melhor serão os cálculos das equações matemáticas inseridas nos modelos numéricos de previsão de tempo e de clima e, consequentemente, melhor a confiabilidade da previsão.

Sobre os equipamentos necessários para a realização de uma previsão climática completa Luiz Kondraski diz que existem diversos tipos de instrumentos, e destaca “estações meteorológicas tanto convencionais (com observador meteorológico e que são divididas em de superfície e de altitude), como automáticas (por meio de computador), imagens de satélite (visualização de nuvens e diferentes superfícies), boias marítimas, balões de radiossondagens e radares meteorológicos (captam dados de chuva)”.

Ele considera sete dias o período de curto prazo para previsão de tempo; até 30 dias para o médio prazo, “quando começa a ser influenciada referindo-se a uma previsão climática”. Para longo prazo, sazonal, “o prazo varia de três a seis meses, que é puramente uma previsão climática”.

“Normalmente o índice de acerto para uma previsão de tempo para 48 horas pode chegar até 95%; de 85% para 72 horas, e de até 75% para período de 96h a 120h”, diz o meteorologista.  Quando o espaço de tempo abrange de 144 a 168 horas (sete dias) o percentual de acerto varia entre 60% e 65%.  “No entanto, quando maior for a resolução de um modelo de previsão de tempo maior será a quantidade de dados a serem processados, pois a área representativa de um ponto pode chegar a 1km², 3 km², 5 km² ou mais. Quanto menor a área maior será a resolução de um modelo”.


Composição do quadro

Saiba como são feitas as previsões de tempo e temperatura

Os cálculos das equações matemáticas que descrevem os processos da atmosfera são feitos pelos computadores. Essas equações são chamadas de modelos meteorológicos. A professora Clara Iwabe explica o passo-a-passo para a composição do quadro da previsão.

“Nesses computadores colocamos os dados meteorológicos observados como pressão, temperatura, vento, umidade medidos por vários meios de medição da atmosfera, como as estações meteorológicas, radares, satélites, radiossondas, etc. Juntando as equações e os dados observados, o computador faz cálculos para obter os campos de pressão, temperatura, vento, umidade, chuva no futuro. Este procedimento se chama previsão numérica. Esses campos meteorológicos obtidos pela previsão numérica são analisados por meteorologistas e assim é emitida a previsão do tempo”.

Para uma previsão perfeita, isenta de erros, segundo ela, teria de ser levado em conta um volume gigantesco de dados (dados que devem estar isento de erros) contendo informações sobre todos os processos naturais envolvidos na atmosfera (física da atmosfera e interação com os oceanos, rios, vegetação, animais, urbanização, radiação solar, poluição, continentalidade, topografia, etc).

Fenômenos no Brasil | “Existem estudos que indicam que as temperaturas tanto máximas como mínimas têm se elevado nas últimas décadas no Sul e Sudeste do Brasil. Mas, ainda não há um consenso entre os cientistas se estes fenômenos meteorológicos extremos como invernos quentes no Sul e Sudeste, secas e chuvas fora de época são consequências do aquecimento global. Além disso, não há consenso se este aquecimento é provocado pelas atividades humanas ou se é um ciclo natural do clima do planeta”, informa Clara Iwabe.


Tradição e ciência

A preocupação do ser humano com as variações climáticas é antiga; o uso da ciência é recente

Segundo a meteorologista Clara Iwabe, o interesse no comportamento da atmosfera é muito antigo, pois a sobrevivência da humanidade depende do conhecimento do tempo e clima.
Para ajudar as pesquisas, ao longo da história muitos instrumentos de medidas de dados meteorológicos foram criados, como termômetros, barômetros, higrômetros, pluviômetros, dentre outros.
“Com a invenção do telégrafo elétrico, por volta de 1840, os dados meteorológicos passaram a ser coletados em uma grande área e se tornou possível produzir mapas atmosféricos de superfície e acompanhar a evolução da atmosfera”, destaca Clara Iwabe.
Atualmente, todo o conhecimento sobre os fenômenos atmosféricos é adquirido através de métodos científicos baseados nas leis da natureza (Leis da Física) e cálculos matemáticos. Assim, surgem os conceitos e teorias matemáticas que descrevem o desenvolvimento de tais fenômenos meteorológicos, podendo desta forma prever sua formação, maturação e dissipação.

Formação | Um curso de graduação em Meteorologia dura entre quatro e cinco anos dependendo da instituição de ensino. Geralmente, os dois primeiros anos são dedicados às disciplinas básicas, como cálculo, física e computação.
Entre o segundo e o terceiro ano iniciam-se as disciplinas específicas, em que o aluno aprende as teorias e conceitos dos processos físicos e químicos da atmosfera, através de aulas teóricas e práticas. No último ano do curso é necessário fazer estágio e elaborar trabalho de conclusão de curso.
“Para ser bom meteorologista é essencial ter formação sólida em física, matemática e computação. As duas primeiras são as bases da atividade. A computação é essencial para as áreas que lidam com grande volume de cálculos e que necessitam ser processadas de forma rápida e eficiente. Portanto, o conhecimento em computação passou a ser essencial para o meteorologista nos dias atuais”.


Equipamentos utilizados

Conheça os instrumentos que compõem uma estação meteorológica

Anemógrafo| Registra continuamente a direção (em graus) e a velocidade instantânea do vento (em m/s), a distância total (em km) percorrida pelo vento com relação ao instrumento e as rajadas (em m/s). Anemômetro | Mede a velocidade do vento (em m/s) e, em alguns tipos, também a direção (em graus). Barógrafo | Registra continuamente a pressão atmosférica em milímetros de mercúrio (mm Hg) ou em milibares (mb). Barômetro de Mercúrio| Mede a pressão atmosférica em coluna de milímetros de mercúrio (mm Hg) e em hectopascal (hPa). Evaporímetro de Piche | Mede a evaporação – em mililitro (ml) ou em milímetros de água evaporada – a partir de uma superfície porosa, mantida permanentemente umedecida por água. Heliógrafo | Registra a insolação ou a duração do brilho solar, em horas e décimos. Higrógrafo | Registra a umidade do ar, em valores relativos, expressos em porcentagem (%). Microbarógrafo | Registra continuamente a pressão atmosférica – em milímetros de mercúrio (mm Hg) ou em hectopascal (hPa), numa escala maior que a do Barógrafo, registrando as menores variações de pressão, o que lhe confere maior precisão. Piranógrafo | Registra continuamente as variações da intensidade da radiação solar global, em cal.cm².mm¹. Piranômetro | Mede a radiação solar global ou difusa, em cal.cm².mm¹. Pluviógrafo | Registra a quantidade de precipitação pluvial (chuva), em milímetros (mm). Pluviômetro | Mede a quantidade de precipitação pluvial (chuva), em milímetros (mm). Psicrômetro | Mede a umidade relativa do ar – de modo indireto – em porcentagem (%). Compõe-se de dois termômetros idênticos, um denominado termômetro de bulbo seco, e outro com o bulbo envolvido em gaze ou cadarço de algodão mantido constantemente molhado, denominado termômetro de bulbo úmido. Tanque Evaporimétrico Classe A | Mede a evaporação – em milímetros (mm) – numa superfície livre de água. Termógrafo | Registra a temperatura do ar, em graus Celsius (°C). Termohigrógrafo | Registra, simultaneamente, a temperatura (°C) e a umidade relativa do ar (%). Termômetros de Máxima e Mínima | Indicam as temperaturas máxima e mínima do ar (°C), ocorridas no dia. Termômetros de Solo | Indicam as temperaturas do solo, a diversas profundidades, em graus Celsius (°C).