Guardadas as proporções, as sementes patenteadas poder ser comparadas com um chip, tal o nível de tecnologia que contêm. Elas proporcionam melhores resultados, porém, o agricultor deverá comprá-la e não poderá vendê-la como semente, mesmo sendo retirada de sua produção

O tempo da semente 100% natural está ficando para trás. Milênios depois de o homem ter descoberto a semeadura como forma de garantir a sua alimentação por perto (pesquisadores atribuem o surgimento dos primeiros cultivos de trigo no Oriente Médio há cerca de 9.500 anos), a substância do grão foi manipulada e modificada em laboratório.

Assim “brotou” o Organismo Geneticamente Modificado (OGM), conhecido também como semente GM (Geneticamente Modificada) ou, mais popularmente, como transgênica.

José Américo Pierre Rodrigues,
presidente da Abrasem

OGM são sementes nas quais são introduzidos genes de outros vegetais, animais, fungos ou bactérias no seu núcleo. Os elementos externos se integram ao genoma da espécie e alteram as suas reações naturais aos estímulos de convivência com o ecossistema, e sua relação com outras formas de vida. “Uma semente geneticamente modificada traz em seu genoma características como tolerância a herbicidas e resistência a insetos”, explica José Américo, Presidente da Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem).

Ele garante que as sementes hoje disponíveis para os agricultores são de altíssima qualidade, uma vez que ao longo do tempo os avanços permitiram o melhoramento genético e a consequente seleção dos melhores germoplasmas para as mais diversas cultivares.

O resultado desses avanços consecutivos é que “atingimos níveis de produtividade muito elevados através desta técnica convencional. Adicionalmente, a biotecnologia agregou novas características às sementes de soja, milho e algodão”, conta o presidente.

Dados da Abrasem revelam que o desenvolvimento de uma planta transgênica consome, em média, 13 anos de pesquisa e investimentos da ordem de US$ 136 milhões. “E toda essa tecnologia está embutida na semente”, diz José Américo, acrescentando que as variedades GM oferecem ao agricultor proteção contra pragas e a possibilidade de flexibilizar o manejo.

Destacando benefícios | O presidente da Abrasem utiliza estatísticas para ressaltar a importância dos produtos das empresas associadas. Inicialmente ele cita dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) sobre produtividade de grãos para reforçar sua tese.

“Entre 1992 e 1998, ano da aprovação da primeira soja transgênica do País, a produtividade da oleaginosa aumentou 17%. Entre 1998 e 2015, já com o advento da biotecnologia, o incremento foi de 27%, passando de 2,3 toneladas por hectare para 3 toneladas por hectare. O caso do milho, outra cultura para a qual a transgenia está disponível, é semelhante. No intervalo dos anos 2001 e 2007, quando o primeiro milho GM foi aprovado no Brasil, a produtividade do grão cresceu 12%. Entretanto, desde a introdução de sementes transgênicas, esse aumento foi de 43%, saindo de 3,6 toneladas por hectare em 2007 para 5,2 toneladas em 2015”.

Vantagens econômicas também foram citadas pelo presidente. “O relatório mostra que a biotecnologia trouxe bons rendimentos aos agricultores, especialmente nos países em desenvolvimento. O benefício líquido em 2013 foi de US$ 20,5 bilhões (aproximadamente R$ 61,5 bilhões), o equivalente a um aumento médio de US$ 122 (R$ 366) por hectare. Nos países em desenvolvimento, os produtores receberam US$ 4,22 por cada dólar investido em sementes transgênicas, enquanto que nos desenvolvidos esse valor foi de US$ 3,88”.

E o apelo ambiental não poderia ficar de fora. Nesse caso José Américo utiliza estudo da consultoria inglesa PG Economics, disponibilizado em 2015, segundo o qual outra vantagem da biotecnologia agrícola “é a redução significativa das emissões de gases do efeito estufa. Isso porque, como o manejo dessas culturas é mais fácil, há menor necessidade de utilização de combustíveis. Em 2013, essa diminuição evitou que 28 milhões de toneladas de dióxido de carbono fossem jogadas na atmosfera, o equivalente à remoção de 12,4 milhões de carros das ruas por um ano”, assegura ele.

Teor nutricional | José Américo diz não ter dúvida sobre os benefícios proporcionados pelos transgênicos à agricultura mundial. Mas, ressalta que novas melhorias nas sementes ainda estão por vir, como consequência do processo natural dos avanços obtidos por meio de estudos e práticas.

“A tendência é que, no curto prazo, devem ser adicionadas às variedades já disponíveis (soja, milho, algodão, canola, entre outros) resistências a outros insetos, tolerância a outros herbicidas e combinação de diversas características visando uma semente cada vez mais protegida”.

Quanto às perspectivas para o médio prazo, ele fala que já é possível pensar na modificação genética de outras variedades (da cana-de-açúcar, eucalipto, cítricos, trigo, arroz) com características agronômicas e também resistência a estresses abióticos (como tolerância a seca e resistência a solos com alto teor de salinidade).

“Para o futuro, ainda há a perspectiva de desenvolvimento de plantas com teor nutricional aumentado e que produzam substâncias com diferentes usos”, garante o presidente da Abrasem.
Mas, ele lembra que para o contínuo desenvolvimento da biotecnologia é preciso reconhecer a autoria das tecnologias geradas depois de anos de muita pesquisa e investimento. “É graças ao sistema de remuneração de tecnologias como a modificação genética que é possível criar um modelo de negócios sustentável, também do ponto de vista econômico, que permita reinvestimento em novas pesquisas. A proteção intelectual pode ser utilizada como ferramenta para a criação de um círculo virtuoso de pesquisa, desenvolvimento e inovação”, conclui.


Produção de GM no mundo

Abrasem destaca produção adicional de soja, milho, algodão e canola

“Nos 18 anos em que a biotecnologia está em uso (1996-2013), as culturas GM foram responsáveis por uma produção adicional de 138 milhões de toneladas de soja e 274 milhões de toneladas de milho. Além disso, a tecnologia também contribuiu com um acréscimo de 21,7 milhões de toneladas de algodão e oito milhões de toneladas de canola”. José Américo, presidente da Abrasem, citando dados da consultoria PG Economics (disponibilizado em 2015).


Mais informações: www.embrapa.br


O que dizem os produtores

Abramilho e da Aprosoja Brasil expressam opiniões sobre os transgênicos

Soja e milho são as principais commodities agrícolas do Brasil. Somadas, as colheitas anuais desses grãos somam cerca de 200 milhões de toneladas por safra, com tendência de crescimento.

Alysson Paolinelli,
presidente executivo da Abramilho e membro do Maizall

Os líderes de associações de produtores aprovam as sementes geneticamente modificadas. “A transgenia é uma evolução da ciência”, define Alysson Paolinelli, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho). “Essa evolução é importante para nós, produtores, que estamos nos esforçando para consolidar uma agricultura tropical forte, e contamos com a biotecnologia como aliada”, complementa.

“Os transgênicos modernizaram e salvaram a agricultura brasileira”, exulta Almir Dalpasquale, da Associação dos Produtores de Soja do Brasil (Aprosoja Brasil).
Ele justifica seu entusiasmo explicando que antes dos transgênicos a soja brasileira vinha perdendo produtividade e espaço devido a ervas daninha que avançavam e praticamente “sem controle” e tomavam conta das lavouras.

Por esse e outros motivos ele reforça a tese de que o produto OGM “mudou a estrutura de produção no País, aumentou a produtividade e proporcionou redução de 40% a 50% na aplicação de agrotóxico”, salienta. Ademais, acrescenta que a nova tecnologia possibilitou a expansão do plantio direto. “Atualmente o sistema PD já abrange 95% da soja”, destaca.

Alysson Paolinelli tem visão semelhante. Ele argumenta, por exemplo, que plantas OGM são resistentes a diversas doenças e pragas, vantagem que possibilita o produtor diminuir a aplicação de defensivos e, consequentemente, reduzir o custo de produção.

A questão da propriedade da marca da semente não deve preocupar, segundo o presidente da Abramilho, pois o produtor só paga pelo produto que vai utilizar. “O fabricante não cobra pela semente, mas pelas tecnologias que elas contêm”, salienta. “O produtor pode fazer a conta e decidir se na sua propriedade vale a pena ou não plantar transgênicos. Caso não seja, utiliza a semente tradicional. É simples”, explica. Da mesma forma ele não acredita na formação de monopólio, “uma vez que muitas empresas grandes atuam no segmento”.

Almir Dalpasquale,
ex-presidente e atual membro da diretoria consultiva da Aprosoja Brasil

Dalpasquale cita a regulação do mercado em geral para dizer que acredita no equilíbrio de preços. “Falando de produtos industriais populares, podemos citar a cerveja, por exemplo, que está sob o controle de poucas multinacionais gigantes. Mas, existem dezenas de pequenas e médias fábricas que ajudam a criar equilíbrio. Se houve aumento exagerado, o consumidor busca outras marcas. Assim também ocorrerá com as sementes transgênicas”.

Ademais, Almir também descarta o risco da OGM acabar com a semente tradicional, obrigando o produtor a comprar todas as vezes que fizer o plantio. “São duas situações distintas. Em primeiro lugar, o agricultor pode continuar plantando a soja tradicional, porém, não alcançará os mesmos índices de produtividade. É uma questão de opção. Contudo, se quiser manter sua lavoura com o que há de mais avançado em tecnologia, pagará por isso. É simples”, salienta.

Ele admite, contudo, um certo risco de sementes transgênicas invadirem outras áreas, levadas pelo vento, por abelhas ou pássaros. “Estamos falando de natureza, de atividade a céu aberto. Então, uma ocorrência aqui ou acolá, pode ser registrada. Mas, são situações circunstanciais, não haverá generalização. A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) são muito ativas, e a legislação brasileira é uma das mais rigorosas do mundo. Pode até ocorrer algum embate jurídico, mas o produtor terá respaldo para comprovar sua idoneidade”.

Alysson Paolinelli é mais enfático, e considera “conversa para boi dormir” as acusações de que os transgênicos podem acabar com as plantas tradicionais. “Temos quase 20 anos de utilização da tecnologia OGM no Brasil. Atualmente, mais de 90% do milho produzido são transgênicos, e não há fatos que comprovem essas acusações. São informações sem fundamento”, contesta.


Dados históricos

A liberação da primeira planta transgênica para fins comerciais ocorreu em 1994 nos Estados Unidos. Na Europa, as patentes não eram permitidas até 1998, com a alegação de que os seres vivos (ou as suas partes) não podiam ser considerados “invenções”. Nesse mesmo ano, o Brasil também liberou a plantação de cultivares geneticamente modificados.
Contestações e processos | Empresas multinacionais produtoras de sementes transgênicas processam centenas de agricultores dos Estados Unidos alegando utilização indevida (não paga) de seus produtos.
Os produtores rurais se defendem dizendo que não plantaram transgênicos, e acreditam que suas lavouras foram “invadidas” por meio de pólen e sementes, conduzidas pelo vento, água, insetos e pássaros.
Na Europa, organizações da sociedade de 20 países diferentes registam a sua oposição, junto do Instituto Europeu de Patentes com objetivo de provar que a concessão de patentes sobre plantas e animais não só é ilegal, como imoral e que inibe a inovação em vez de a estimular, ameaçando a agrobiodiversidade.
Alegam que nos últimos 100 anos, a tarefa de melhoramento de plantas no mundo industrializado foi passando, progressivamente, dos agricultores para as corporações. 
Ambientalistas alertam para riscos de do transgênico esterilizar plantas nativas e silvestres dos ecossistemas globais.