Proposta de alíquota única pode prejudicar produtores rurais e empresas de agronegócio, mas aumentar competitividade internacional

Com as discussões em torno da reforma tributária, vários setores da economia podem ser afetados. O agronegócio é um deles. Uma vez que alguns elos da cadeia de produção do agronegócio podem sofrer aumento da tributação, a categoria apresenta resistência à aprovação da reforma. As diretrizes para a mudança dos impostos apresentadas por grupo de trabalho na Câmara preveem que o agronegócio seja tratado de forma diferenciada.

A reforma defende a criação de um imposto único sobre o valor adicionado (IVA), em substituição ao PIS, COFINS, IPI, ICMS e ISS. A advogada tributária do Murayama, Affonso Ferreira e Mota Advogados, Mariana Valença, afirma que o novo modelo de tributação vai atingir todos os setores do consumo. “O IVA, basicamente, cobre todo o processo e cadeia de produção, buscando evitar a cobrança acumulada de impostos em diferentes etapas e oferecendo maior transparência com um valor único cobrado ao final das operações”, explica ela.

A fixação de uma alíquota única poderá aumentar a oneração dos pequenos produtores, na medida em que, com a reforma, eles passarão a pagar o imposto com a alíquota única, ao contrário do regime tributário atual em que são desonerados apenas alguns tributos. Segundo Mariana, isso gera um aumento no custo sem possibilidade de repassar o valor no preço de produção. “Dessa forma, o ideal seria criar uma diferenciação para os produtores rurais das empresas que atuam na agroindústria, de modo que o primeiro seja tributado com uma alíquota menor”, acrescenta a advogada tributarista.

Além disso, ela aponta que quando os pequenos produtos vendem os produtos para as empresas das agroindústrias recolhem o  ICMS, PIS e COFINS utilizando-se do benefício do crédito presumido, o qual permite a redução do valor a ser pago. “Com a incidência do IVA, o crédito presumido deixará de existir”.

“Por outro lado, a reforma tributária não prevê a tributação na exportação, o que poderá beneficiar o agronegócio, aumentando, assim, a competitividade internacional, caso seja prevista a possibilidade de crédito aos produtores rurais”, contrapõe a especialista.

 

Produtores rurais X empresas – É importante destacar que os produtores rurais e as empresas agroindustriais têm estruturas e modelos de negócios diferentes. Enquanto os primeiros geralmente estão envolvidos nas atividades de cultivo ou criação de animais, as empresas agroindustriais estão envolvidas em processos de beneficiamento, processamento e comercialização de produtos agrícolas. “Essas diferenças estruturais podem levar a necessidades tributárias distintas, exigindo uma abordagem diferenciada na legislação tributária”, ressalta Mariana.

Muitas vezes, os produtores rurais operam em escalas menores em comparação com as empresas agroindustriais, que tendem a ter operações em larga escala. “Assim, a principal diferença para que os produtores rurais se distingam das empresas da agroindústria na reforma tributária é que os primeiros são desonerados de alguns tributos e os demais que atuam na agroindústria não, de modo que caso não tenha previsão de uma tributação diferenciada, com a reforma, passarão a pagar o imposto com a alíquota única, gerando, assim, um aumento no custo sem possibilidade de repassar o valor no preço de produção”, diferencia a tributarista.

 

Isenção fiscal – Em paralelo ao debate no Congresso, o Supremo Tribunal Federal está julgando a inconstitucionalidade da isenção fiscal de agrotóxicos. Na visão de Mariana, a medida seria inconstitucional uma vez que viola o direito constitucional à saúde. “A isenção dos agrotóxicos poderia permitir a utilização de substâncias perigosas sem uma regulamentação adequada, colocando em risco a saúde dos agricultores, dos consumidores e do meio ambiente. Além disso, ela promove uma situação de desigualdade ao isentar os agrotóxicos de regulamentações mais rigorosas, podendo haver uma disparidade no tratamento entre diferentes setores da agricultura e entre os agricultores, favorecendo aqueles que utilizam agrotóxicos em detrimento dos que optam por métodos mais sustentáveis”, comenta a advogada.


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