A reforma tributária e os impactos na agricultura familiar

Por Debora Espindola Campista Rocha*

  

A agricultura familiar corresponde a mais de 5 milhões de propriedades rurais de todo o Brasil, sendo responsável pelo abastecimento de cerca de 70% dos alimentos que chegam na mesa dos brasileiros. Apesar disso, ainda vem sofrendo gravemente os efeitos econômicos da pandemia da Covid-19.

Neste momento em que o poder legislativo segue no debate sobre a reforma tributária no país, há grande expectativa sobre o impacto que as propostas em discussão poderão acarretar ao setor do agronegócio, bem como sua repercussão na economia nacional, em especial para a agricultura familiar.

O Projeto de Lei 3887/2020 apresentado pelo executivo em 21/07/2020, tramitando no momento na Câmara, prevê uma simplificação dos impostos e manutenção da carga tributária, onde nessa primeira fase da reforma deve conter a unificação do PIS e COFINS em um único tributo com alíquota a ser aplicada em 12%. Isso terá como resultado a oneração de todos os produtos da cesta básica, afetando diretamente a agricultura familiar, que ainda se submete ao tributo de 25% sobre as transações de bens e serviços.

Neste ponto, é preciso ressaltar que tramitam outras duas propostas de reforma em paralelo, sendo a PEC 45 apresentada pela Câmara, que pretende extinguir cinco tributos, e a PEC 110 apresentada pelo Senado, que visa substituir nove tributos por um imposto único, o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), previsto para incidir sobre todas as operações com uma única alíquota, o que pode até dobrar a carga total de impostos sobre o agro.

Economistas afirmam que com a mudança prevista na tributação no setor do agro será onerado de forma expressiva para os pequenos e médios produtores – dentre os quais se enquadram a agricultura familiar, pois os variados textos podem acabar se confrontando. Considerando a possibilidade de implementação da alíquota única para o IBS, enquanto a PEC 45 estabelece a média de 25%, há o risco de haver uma duplicidade no custo do produto tributado em relação ao que temos hoje.

Além disso, algumas cadeias menores irão sofrer mais do que outras, como é o caso dos produtores de leite, que em sua maioria são pertencentes da agricultura familiar, que no presente momento não realizam a apuração dos tributos, mas com a mudança irá pagar o IBS, tendo como resultado prejuízo na sua contabilidade.

Já no caso dos produtores rurais, pessoas físicas, sobre os quais não recaíam os tributos de PIS e COFINS, com a implementação do IBS passarão a ser contribuintes em uma alíquota total maior. Em outras palavras, caso as propostas sejam aprovadas há o risco de serem obrigados a pagar por um tributo que antes eram isentos, aumentando seus custos de realização do gerenciamento da sua produção.

Não restam dúvidas que as propostas da reforma tributária em tramitação atingem vários benefícios conquistados com muita luta por alguns setores produtivos. No setor do agronegócio, em específico, as propostas visam transformar os produtores rurais em contribuintes, além de onerar ainda mais a tributação dos insumos necessários à produção, assim como impactar diretamente no preço da cesta básica, cujos alimentos são, em sua grande maioria, oriundos de culturas de pequenos produtores. Em resumo, a criação de novos tributos está pautada exclusivamente no aumento da base para o setor de arrecadação.

Ainda, há que se considerar que poderá gerar como resultado o risco de insegurança jurídica ante a possibilidade de coexistirem dois sistemas tributários completamente distintos em relação ao consumo, já que a transição está prevista para ocorrer ao longo de 10 anos.

Com o estado de calamidade pública, não são poucas as preocupações do setor. Em uma realidade econômica em que nos deparamos, com fluxo de caixa deficitário, milhões de desempregados, eleições municipais iminentes, resta a grande apreensão dos pequenos produtores rurais, que anseiam pela simplificação da tributação e por reformas que sejam mais benéficas para a economia e para o setor mais produtivo do país.


REFERÊNCIAS


(*) Debora Espindola Campista Rocha é advogada do MLA – Miranda Lima – Advogados