Oitava edição do evento da Associação de Terminais Portuários Privados reúne especialistas e autoridades para discutir a desestatização dos portos e contribuir para o desenho de uma modelagem ideal para o processo no Brasil

O processo de desestatização dos portos avança no Brasil com apoio do setor portuário privado, mas a modelagem a ser adotada para a Companhia das Docas do Espírito Santo (Codesa) e que pode servir de base para os demais terminais, como o Porto de Santos, é motivo de atenção e preocupação da ATP (Associação de Terminais Portuários Privados). Nesta quarta-feira (27), em Brasília, a ATP reuniu especialistas, representantes dos TUPs (Terminais de Uso Privado) e autoridades para o 8º Encontro ATP, com objetivo de ampliar o debate sobre o tema: “Desestatização dos Portos Organizados: Uma Visão do Setor Privado”

Participaram do evento, entre palestras e debates, o ex-secretário de Desestatização do Governo Federal, Salim Mattar, o economista Armando Castelar, o Secretário Nacional de Portos e Transportes Aquaviários, Diogo Piloni, o CEO do Porto Itapoá, Cássio Schreiner, a professora e especialista em Sustentabilidade, Cidades e Governança Portuária, Flávia Nico, e o Presidente Executivo da ANUT (Associação Nacional dos Usuários do Transporte de Cargas), Luís Henrique Baldez.

O presidente da ATP, Murillo Barbosa considera relevante reunir os players centrais do mercado para debater o tema que está na agenda prioritária do Governo. “O setor portuário brasileiro vive um momento importante de sua história, com o encaminhamento do processo de desestatização dos portos organizados. Esse avanço é uma conquista para o segmento portuário brasileiro, pois representa o reconhecimento do Governo Federal sobre a necessidade de aperfeiçoamento da gestão da Autoridade Portuária”, disse.

Entretanto, Barbosa reforçou a necessidade de atenção do setor sobre a definição da modelagem que pode ser a base para outros portos, como o Porto de Santos, prevista para 2022.
“A ATP defende firmemente a desestatização para a melhoria da gestão da Atividade Portuária, mas existe uma grande preocupação em todo o setor com a definição de um modelo único para a desestatização da Codesa e de Barra do Riacho e seus desdobramentos nos outros processos”, afirma.

Ele lembra que deixar de considerar os modelos previstos no Plano Nacional de Desestatização, como a concessão de serviços ou alienação plena, poderá conduzir a um método limitante de escolha da melhor opção para o processo de desestatização dos portos, já que cada complexo portuário a ser desestatizado tem suas necessidades e especificidades.

“A oitava edição do Encontro da ATP trouxe grandes contribuições ao processo para que que ele represente e alcance o interesse comum: o incremento da eficiência da operação e o fortalecimento da competitividade do setor portuário nacional”, analisou.

O ex-secretário de Desestatização do Governo Federal, Salim Mattar proferiu a palestra magna do evento e defendeu a necessidade de processos de privatização em todos os segmentos, inclusive, no setor portuário e a diminuição da máquina do Estado para avanço da economia e erradicação da pobreza.

“O Estado não pode ser ‘empresário’. Ele deve ter foco no que é sua função e não estar inserido no mundo dos negócios. Estado deve cuidar do cidadão, de segurança de saúde e educação. Isso sim estratégico pais. Ao privatizar, reduzimos Estado e acabamos com ineficiência na gestão. Com a máquina mais enxuta, país será mais eficiente e forte”, disse.

 

Painel e debates – O economista Armando Castelar, coordenador de Economia Aplicada do IBRE/FGV e professor do Instituto de Economia da UFRJ, comandou o painel principal do 8º Encontro ATP, com o tema ‘Desestatização dos portos organizados: Uma visão do setor privado’. Castelar apresentou um histórico dos processos de privatização no país, desde os anos 1970, e defendeu a necessidade de um modelo que atraia investimentos.

Segundo ele, a movimentação de cargas no Brasil cresce mais rápido que a economia, com incremento de 3,2% ao ano na última década e com projeções de crescimento significativo para os próximos anos. Enquanto isso, de acordo com o professor, o setor público abandonou os investimentos no setor portuário e não há nenhuma perspectiva de alteração deste quadro.

Castelar destacou que esse cenário de descompasso entre a expansão da capacidade da infraestrutura portuária frente ao crescimento do setor, se tornou um gargalo da cadeia produtiva brasileira.

“Para desfazer esse gargalo, é preciso desestatizar os portos. Sem isso, teremos um problema seríssimo na competitividade, em que pese todo o sucesso e desempenho dos TUPs ao longo das últimas décadas. O setor privado está respondendo, mas precisa ter espaço para responder ainda mais. Essa é a questão central do desafio atual. É preciso um modelo que atraia mais investimentos para infraestrutura, para administração portuária, mas que não atrapalhe o sucesso atual e não impeça todo o desenvolvimento dos Terminais de Uso Privado”, disse.

Em sua participação no debate do 8º Encontro da ATP, o secretário nacional de Portos e Transportes Aquaviários do Ministério da Infraestrutura, Diogo Piloni, apontou que a agenda de privatização dos portos públicos está em andamento e não será um elemento potencializador de concentração de mercado e que o modelo de desestatização elaborado pelo governo é capaz de gerar vantagens para os usuários, especialmente, na redução de tarifas, no caso do Porto de Santos.

O secretário afirmou que a proposta de desestatização será publicada até o final de novembro, com previsão de redução de 30% da principal tarifa paga pelas companhias. Segundo ele, trata-se de uma oportunidade única de converter a ineficiência da gestão estatal em investimento.

“O projeto para o Porto de Santos é capaz de gerar R﹩ 16 bilhões de investimentos em ativos comuns do porto, melhorias de acessos terrestres, sem onerar em tarifa. O modelo de Santos vai mostrar que é possível fazer volume enorme de investimentos com redução de tarifas. Ele vai gerar redução de 30% da tabela 1, principal fonte de arrecadação das autoridades portuárias”, garantiu.

O representante dos Usuários do Transporte de Cargas, o presidente da ANUT, Luis Henrique Baldez, demonstrou preocupação com eventual desestímulo à concorrência e cobrou que o modelo de desestatização reverta os ganhos de eficiência em vantagens para os usuários, com tarifas justas.

“Queremos que no modelo de desestatização, seja ele qual for, que os ganhos de produtividade estejam refletidos nas tarifas a serem pagas pelos usuários. Esse processo não pode concentrar mais os ganhos. Queremos que leve a melhoria de produtividade, aumento de capacidade, mais oferta, pouca concentração e tarifas justas”, disse Baldez.

Já o CEO do Porto Itapoá, Cássio Schreiner, associado e conselheiro da ATP, defendeu a menor politização dos processos desestatizantes que podem colocar em suspensão o endereçamento de processos por intervenções políticas. “Com menor intervenção polícia, os processos serão conduzidos e serão consideradas a priorizações que são parte dos planos do Governo e do Ministério de Infraestrutura”, analisou.

A professora e especialista em Sustentabilidade, Cidades e Governança Portuária, Flávia Nico demonstrou preocupação com a função social dos portos após o processo de desestatização e a necessidade de intensificar ações e uma cultura em prol da sustentabilidade nos portos privados.

“Neste momento de desestatização, a sustentabilidade deve estar no topo da discussão. Trata-se de uma oportunidade para os TUPs repensarem essa questão, já que vão assumir novas funções. A sustentabilidade deve estar no DNA de uma empresa e não apenas em ações isoladas. A desestatização aumenta e reforça a importância da agenda da sustentabilidade nos TUPs”, concluiu.

 

Homenagem – Durante o 8º Encontro da ATP, o setor portuário se despediu de Clythio Backx Van Buggenhout, diretor de relações governamentais da Cargill, que faleceu nesta quarta-feira (27). Na abertura do evento, o presidente da ATP, Murillo Barbosa, prestou homenagem ao amigo e lembrou que Van Buggenhout foi fundador, mentor e conselheiro da associação.

“Ele é considerado uma unanimidade no segmento portuário. Foi um falecimento surpreendente de uma pessoa cheia vida e de planos. Tínhamos uma amizade de mais de 20 anos e planos conjuntos para o desenvolvimento do setor portuário que foram interrompidos abruptamente”, declarou.

Após a homenagem da ATP, todos os presentes ficaram de pé e aplaudiram Clythio Backx Van Buggenhout.

 

Encerramento – O encerramento do evento ficou a cargo de Patrícia Lascosque, presidente do Conselho Diretor da ATP, que fez uma analogia entre o cenário atual do setor portuário, com o pós-pandemia e retomada da economia em meio às mudanças como a desestatização, e uma embarcação prestes a enfrentar uma tempestade.

“A tripulação precisa ser competente, ter confiança uns nos outros e comprometimento para atravessar a tempestade. Participamos de diversas reuniões sobre desestatização, onde stakeholders deram sugestões, como uma tripulação coesa, pois se a embarcação for a pique todos nós vamos morrer e nem será na praia”, disse. Patrícia ressalta que a tripulação precisa ser, de fato, participativa na tomada de decisão sobre o futuro do setor. “Não queremos apenas ser ouvidos, queremos ser considerados. Estamos juntos e somos um só time dentro dessa embarcação”.

E complementou: “Temos hierarquias e papeis diferentes, mas todos seguimos para o mesmo destino. E nosso destino é a competitividade. O que o setor quer é que essa embarcação efetivamente chegue competitiva no mercado internacional. O Brasil não pode seguir no retrocesso que vivemos. Somos empresários sérios e comprometidos com o desenvolvimento do nosso país, muito além do crescimento das nossas empresas. Somos brasileiros e a competitividade do Brasil passa por cada um de nós”, enfatizou.


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