Pesquisa da Escola Politécnica da USP avalia tecnologias que melhoram eficiência logística em termos sociais, econômicos e ambientais.

Um dos principais corredores utilizados para a exportação da soja brasileira liga a região de Sorriso, onde se localiza a maior produção dessa commodity no estado líder no cultivo da soja, o Mato Grosso, ao porto de Santos, no litoral paulista. Por esse corredor passaram 8,5% da soja produzida neste estado destinada ao mercado externo. Uma pesquisa desenvolvida na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP) mostra que a adoção de tecnologias que transformem essa rota em um corredor verde poderia reduzir em 55,5% as emissões de gás carbônico e em 84,8% as de óxido de nitrogênio, além de diminuir o tempo relativo das viagens em 15,8%, o congestionamento na região portuária em 16,7% e o custo do transporte em 3,1%.

Esse é um dos três corredores usados para o escoamento da produção de soja estudados por João Ferreira Netto, pesquisador do Centro de Inovação em Logística e Infraestrutura Portuária (CILIP), vinculado ao Departamento de Engenharia Naval e Oceânica da Poli-USP. Ele propõe em sua tese de doutorado a adoção das melhores práticas de um corredor verde também para a rota Sorriso – Paranaguá (Paraná) e para a ligação entre a região da cidade de Sapezal (também no Mato Grosso) a Santarém (Pará).

Corredores verdes são estruturas pelas quais se transporta grandes volumes de mercadorias, utilizando a combinação dos modais rodoviário, ferroviário, fluvial e marítimo com a aplicação de novas tecnologias que ajudam a equilibrar a produtividade e sustentabilidade, reduzindo os impactos ambientais. O conceito surgiu na Europa, com o objetivo de tornar o sistema logístico mais eficiente e reduzir seus impactos, e tem sido aplicado em corredores que ligam diversos países, como o que vai da Escandinávia até a Itália e outro que liga a Suécia à Alemanha.

“Diversos requisitos são observados para transformar um corredor em corredor verde: combustíveis, motores, tecnologia da informação, aspectos operacionais, regulatórios etc, tudo que ajude o setor de transporte e logística a realizar viagens mais objetivas, usando as menores distâncias e reduzindo as emissões de gases poluentes por meio da diminuição do consumo de combustíveis”, explica. “Em minha pesquisa, estudei três rotas utilizadas para escoamento da produção de soja e constatei que é possível, sim, implementarmos corredores verdes no País, apesar das sérias deficiências em infraestrutura”, acrescenta Netto.

O Brasil é o segundo país produtor de soja no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, e exportou 51,6 milhões de toneladas do produto no ano passado, de acordo com o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços. A produção na safra 2016-2017 deve ser de 113,923 milhões de toneladas, em uma área plantada de 33,890 milhões de hectares, segundo dados da Embrapa. Os números dão uma dimensão do quanto a produção de soja impacta a questão do transporte no País e justificaram a seleção desse produto e, por consequência, dos corredores de escoamento da produção para a pesquisa que avaliou a possibilidade e os ganhos com a criação dos corredores verdes. A escolha das rotas levou em consideração a utilização dos diferentes modais e a concentração de cargas transportadas.

Para a avaliação, ele definiu indicadores de desempenho (KPIs) como, por exemplo, o custo relativo, tempo de transporte, confiabilidade, emissões de gás carbônico, monóxido de carbono e oxido nitroso, os congestionamentos, e a qualidade das infraestruturas rodoviária, ferroviária, hidroviária e dos portos.

Segundo Netto, o corredor que demonstrou maior potencial para ser ‘convertido’ em corredor verde é o de Sapezal-Santarém. “A maior parte da soja que exportamos, em termos de volume, vem para Santos, mas esse corredor até o Pará tem um dos maiores potenciais porque utiliza grande trecho do modal hidroviário”, explica. Trata-se de um corredor subutilizado atualmente porque, de acordo com o pesquisador, os terminais não têm capacidade adequada.

“Já o corredor até Santos apresenta, hoje, os melhores indicadores no quesito confiabilidade, ou seja, ele tem menor probabilidade de atraso nas entregas porque usa a ferrovia, e também apresenta maior rapidez”, aponta. Essa rota, porém, está sobrecarregada. “O impacto causado na população de Santos pelo uso desse corredor nos períodos de safra é grande, por conta dos congestionamentos e das emissões causadas pelos caminhões que chegam ao porto”, lembra.

Soluções tecnológicas – A pesquisa não só avaliou quais seriam os melhores trajetos para se instalar corredores verdes, mas, partindo da situação destes como estão, propõe o uso de tecnologias já aplicadas em outros corredores verdes existentes, principalmente na Europa. No estudo, Netto aponta os percentuais de melhoria que a implementação dessas tecnologias pode trazer em cada corredor, para cada um dos KPIs definidos na avaliação prévia.

No caso do corredor Sorriso-Santos, por exemplo, o uso de veículos movidos a gás natural poderia reduzir em 70% as emissões de óxido nitroso e 12,5% as de gás carbônico. Se fossem utilizadas unidades de carga e descarga automática e também de carregamento intermodal, haveria uma redução no tempo relativo da viagem de 7,1% e 8,7%, respectivamente. Caso fosse adotada a tecnologia de recuperação da energia de frenagem e sistemas de energia a bordo no sistema ferroviário, a redução das emissões de gás carbônico seria de quase 10%. O uso de caminhões híbridos (como os que usam biodiesel e eletricidade) reduz em 2% os custos e em 18,3% as emissões de gás carbônico. Se os caminhões passarem a usar pneus de baixa resistência ao rolamento, o impacto na redução de emissões de gás carbônico seria de 2%.

Desafios – São grandes os desafios para implementar corredores verdes no Brasil. Além de lidar com os problemas de infraestrutura, também existe a questão regulatória. “Na implementação dos corredores verdes europeus foi feito um esforço para uniformizar o processo de fiscalização dos diversos países. É importante ter a regulamentação porque isso torna a operação mais rápida. No Brasil, precisamos destravar nossos terminais e ganhar tempo no processo burocrático alfandegário, entre outras medidas”, aponta o pesquisador.

Cedo ou tarde o Brasil precisará ter corredores verdes. Atualmente ainda não existe na Europa a exigência de que mercadorias sejam transportadas por corredores verdes, entretanto, existem incentivos e mecanismos de financiamento, por parte do governo de alguns países, como a Suécia, que estimulam sua utilização e o desenvolvimento destes corredores no continente.

“Em algum momento, podemos ser surpreendidos pela exigência de corredores verdes para poder exportar algum produto. É difícil dizer quando vamos chegar lá, mas ter uma logística responsável do ponto de vista ambiental, econômico e social será uma exigência para participar do mercado internacional”, finaliza o professor Rui Carlos Botter, que orientou a pesquisa.


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