A inovação é baseada no uso de lignina kraft, componente da madeira e de outras partes das plantas, obtida como substrato de processos da indústria de papel e celulose

 

De acordo com recentes estudos, realizados em escala mundial, a radiação ultravioleta tem ganhado destaque enquanto um fator de estresse abiótico ambiental que afeta consistentemente o potencial de rendimento de culturas agrícolas, causando perdas em seu rendimento. A cultura do algodão, por exemplo, quando exposta a uma radiação crescente de 9,5 % UV-B, pode ser impactada por uma redução de 72 % de rendimento, enquanto a soja tem sofrido uma supressão latente de 15% em sua produtividade, perante os níveis atuais de radiação UV que tem enfrentado.

Frente a esse cenário, pesquisadores parceiros do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Nanotecnologia para Agricultura Sustentável (INCT NanoAgro) vêm desenvolvendo soluções sustentáveis para mitigar os danos causados pela radiação UV em lavouras. Uma dessas inovações é o uso de lignina kraft (KL) e seus derivados fracionados com ácido acético, aplicados como aditivos funcionais em filmes agrícolas de álcool polivinílico (PVA). Esses compostos têm sido avaliados por suas propriedades antioxidantes e pela capacidade de absorção da radiação ultravioleta C (UV-C), com o objetivo de reduzir a degradação foto-oxidativa dos filmes e aumentar sua durabilidade e eficiência no campo.

No estudo publicado pelos pesquisadores na Revista Internacional de Macromoléculas Biológicas, foram preparados filmes de PVA contendo macropartículas de KL, além de versões com nanopartículas de lignina (NP). Todas as formulações foram enriquecidas com fertilizante NPK e plastificadas com glicerol, formando filmes moldáveis para cobertura de solo. Após 21 dias de exposição à radiação UV-C, os filmes contendo nanopartículas de lignina mantiveram mais de 90% de transparência, importante para permitir a passagem da luz solar para a fotossíntese, contrastando com a queda para cerca de 70% nos filmes de PVA puro. Assim, técnicas analíticas como espectroscopia no infravermelho com transformada de Fourier e calorimetria exploratória diferencial confirmaram a menor degradação térmica e fotooxidativa nos filmes com lignina.

“Os testes de biodegradação respirométrica (liberação de CO₂) revelaram ainda maior atividade microbiana nos filmes, alcançando liberação de até 90 mg de CO₂ em 20 dias, indicando um processo acelerado de degradação ambientalmente benigna, o que revela que, além de proteger o solo de forma otimizada, a solução permite ainda um aumento na biodegradabilidade do filme PVA”, pontua Leonardo Fraceto, coordenador de INCT NanoAgro e pesquisador envolvido na inovação. Ensaios de lixiviação — remoção de substâncias (como nutrientes e metais) de um material — demonstraram que os filmes com as soluções desenvolvidas permitiram uma liberação controlada de nutrientes ao longo de 40 dias, funcionando como veículos de fertilização gradual.

Em aplicações práticas, o filme de PVA foi testado como cobertura morta em cultivos de tomate cereja, apresentando desenvolvimento de mudas comparável ao de filmes mulch comerciais e desempenho superior aos filmes controle. Os resultados indicam que a incorporação de nanopartículas de lignina pode oferecer uma solução multifuncional, biodegradável e de alto desempenho, promovendo proteção UV, controle de nutrientes e sustentabilidade ambiental na produção agrícola.

Saiba mais sobre o estudo NESSE LINK..

Criado com o objetivo de qualificar e congregar recursos humanos de alto nível de diferentes áreas para promover avanços na fronteira do conhecimento em nanotecnologia para Agricultura Sustentável, o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Nanotecnologia para Agricultura Sustentável (INCT NanoAgro) faz uso de componentes da biodiversidade brasileira e de suas interações ecológicas para desenvolver sistemas integrados para o controle de pragas e doenças, nutrição e estímulo de crescimento vegetal, de forma a aumentar a produtividade agrícola sem desconsiderar a segurança ambiental e da saúde humana, criando um protagonismo do país no cenário mundial.

Por Milena Almeida, assessora do INCT Nano Agro.